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O papel da formação contínua no desenvolvimento profissional do professor. Parte I – O diagnóstico
Carlos Grilo e
Paula Grilo Em Portugal, tal como noutros países, vive-se actualmente um período de mudanças na organização curricular do ensino secundário, particularmente na área das ciências experimentais. Conceitos tais como flexibilidade do currículo, clima facilitador da aprendizagem, interdisciplinaridade e abordagem holística dos temas estudados nas disciplinas de ciências, enfoque numa abordagem cooperativa de temáticas do quotidiano do aluno de cariz integrador, formação para a cultura científica e para a cidadania, insistência na experimentação e na investigação realizada por alunos e professores com vista à construção do conhecimento, constituem só algumas das ideias centrais que sobressaem da nova revisão curricular do ensino secundário e também das novas propostas a nível internacional. Uma mudança desta natureza exige novas formas de estar e actuar por parte dos professores de ciências, uma vez que qualquer reforma educativa necessita contar com um corpo docente adequadamente preparado e disposto a levá-la a cabo. A resistência à mudança advém frequentemente do facto de os professores evidenciarem uma série de concepções, crenças e atitudes acerca da ciência, do processo de ensino e aprendizagem e dos papéis atribuídos aos alunos. Os professores possuem rotinas muito bem definidas, que são extraordinariamente estáveis e difíceis de mudar (Mellado, 1996). Estas convicções foram adquiridas de forma não reflexiva durante a sua experiência como alunos na escola e na universidade (Gil et al., 1999), pelo que os professores tendem a ensinar do mesmo modo que eles próprios aprenderam. A própria formação inicial pode ser um destes obstáculos se os professores não dominarem bem os conhecimentos científicos e didácticos. Um conhecimento deficiente do conteúdo pode conduzir, no próprio professor, ao desenvolvimento de concepções alternativas sobre os conceitos científicos, o que, indubitavelmente, faz com que tenha mais dificuldades em diagnosticar as concepções alternativas e as dificuldades de aprendizagem dos alunos (Mellado, Blanco e Ruiz, 1999). As acções de formação contínua dirigidas a professores em exercício também se têm revelado pouco eficazes, uma vez que existe uma grande diferença entre o saber que se declara (crenças e ideias explícitas do professor), o saber fazer procedimental (traduzido nas suas rotinas e ideias implícitas) e o saber ligado à acção, que emerge quando dá uma aula ou quando planifica uma unidade didáctica (Garcia Diaz e Cubero, 2000). Muitos professores que frequentam estes cursos acreditam que quando os terminam estão melhor preparados para exercer a sua actividade profissional. Contudo, a maioria, passado algum tempo volta a ensinar da mesma forma, adaptando o que aprendeu aos padrões tradicionais. Por isto, o conceito de desenvolvimento profissional implica uma ruptura com a perspectiva clássica de formação, marcada por uma lógica escolar e por frequentar cursos de maior ou menor duração que estão normalmente organizados tematicamente e se destinam a colmatar as deficiências de conhecimento do professor em relação a determinados conteúdos disciplinares ou pedagógicos, através da transmissão de informação (Ponte, 1998). O desenvolvimento profissional deve integrar a teoria e a prática e considerar o professor como sujeito da formação e não como simples objecto. É fundamental que se dedique uma atenção especial às suas potencialidades, considerando o professor nas suas múltiplas facetas, ou seja, nos seus aspectos cognitivos, afectivos e racionais, e que se lhe atribua o poder de decidir as questões a estudar, os projectos a empreender e o modo de os executar. Ao longo dos anos tem sido notório que falar sobre os problemas inerentes ao processo de ensino e aprendizagem, discutir metodologias e apresentar propostas inovadoras, baseadas e fundamentadas em resultados de investigações no campo da didáctica não têm surtido o efeito desejado na mudança das práticas lectivas. O ponto crucial da questão foi deixar de considerar os professores como consumidores de conhecimentos ou implementadores de políticas curriculares formuladas como resultado de investigações educativas. Ao invés, começou a dar-se importância à necessidade do professor se questionar a si próprio e reflectir acerca das suas concepções sobre distintos aspectos do processo de ensino e aprendizagem bem como acerca das suas acções na sala de aula (Vásquez et al, 2007). Referências: García Diaz, J.E. e Cubero, R. (2000). Constructivismo y formación inicial del profesorado. Investigación en la Escuela, 42, 55-66. Gil, D., Furió,c., Valdés, P., Salinas, J., Martinez-Torregrosa, J., Guisasola, J., González, E., Dumas-Carré, A., Goffard,M. y Carvalho, A.m. (1999). ¿Tiene sentido seguir distinguiendo entre aprendizaje de conceptos, resolución de problemas de lápiz y papel y realización de prácticas de laboratorio? Enseñanza de las Ciencias, 17(2), 311-320. Mellado, V., Blanco, L. e Ruiz, C. (1999). Aprender a enseñar ciencias experimentales en la formación inicial del profesorado. Estudios de caso sobre la enseñanza de la energía. Badajoz: ICE de la Universidad de Extremadura. Mellado, V. (1996). Concepciones y prácticas de aula de profesores de ciencias, en formación inicial, de primaria y secundaria. Enseñanza de las Ciencias, 14(3),398-412. Ponte, J. P. (1998). Da formação ao desenvolvimento profissional. Actas do ProfMat, 98 (pp. 27-44). Lisboa: APM. Vázquez, B., Jiménez, R., e Mellado, V. (2007). La Reflexión en profesoras de ciencias experimentales de enseñanza secundaria. Estudios de casos. Enseñanza de las Ciencias, 25(1), 73-90.
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