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Educação formal e educação não formal: uma coabitação possível

Paulo Costa*
Agrupamento de Escolas
de Campo Maior

Muito antes de haver Escola, já havia educação. A educação é um processo de aquisição de conhecimentos que permite ao indivíduo ir crescendo, contactar com as regras da sociedade, melhorar as suas condições de vida e, em última análise, melhorar as condições de vida da sociedade onde se insere.

A Escola veio criar um espaço privilegiado à transmissão de conhecimentos adquiridos pelas gerações anteriores. Com o tempo houve necessidade de, numa determinada sociedade, todos os seus cidadãos terem a mesma base de conhecimento, de conteúdos e de competências consideradas úteis em determinado momento. É assim que nascem as escolas generalizadas com um curriculum nacional, onde todos os indivíduos, independentemente do seu estrato social, da sua religião ou da sua localização dentro do território, passem a ter acesso ao mesmo conhecimento. Esta é a educação formal, estruturada, regrada e avaliada.

Mas, ao lado desta educação, coexiste uma outra não regulamentada onde não há exames para verificar o seu grau de consecução e onde a obrigatoriedade também não existe: a educação não-formal.

Mesmo com vastos curricula, com o pouco tempo que as sociedades contemporâneas dão aos alunos, ainda é possível haver espaço dentro de uma escola para a educação não-formal. Para tal, serão necessários três ingredientes: professores disponíveis, alunos desejosos de mais conhecimentos e temas apelativos para os jovens.

Tem sido tradição na Escola Secundária de Campo Maior que um grupo de alunos, que rondará os trinta, participe todos os anos em diversos projetos direcionados para a discussão de problemas contemporâneos. Para além da participação em projetos ligados ao IPJ, existem dois projetos de referência e de representatividade: o Parlamento dos Jovens e Entre Palavras. O atual Parlamento dos Jovens, antigo Hemiciclo, tem sido trabalhado na escola há quinze anos e, das nove sessões do Entre Palavras, a Escola Secundária de Campo Maior esteve a representar o distrito oito vezes na sessão nacional.

Os dois concursos alinham no mesmo espírito: são colocados problemas da sociedade e os jovens pesquisam, debatem e propõem soluções. Estes jovens, que chegam a participar durante seis anos (todo o seu percurso escolar nesta escola) disponibilizam o seu tempo de lazer para trabalharem em ideias que não fazem parte dos testes de avaliação. Preparam, com afinco, teses e desenvolvem-nas; estruturam apresentações orais e debates superando alguns deputados ou especialistas em matérias tão complexas como a economia, a política, o desemprego, a violência doméstica ou o aborto; apresentam propostas inteligentes e exequíveis ao ponto de se tornarem Lei. Estes jovens, durante toda esta atividade, estão a crescer, a adquirir conhecimentos e a consolidar competências argumentativas tão úteis numa sociedade onde a palavra é rainha.

Estes alunos, talvez, tenham obtido melhores resultados nos exames nacionais não só porque conheciam melhor o mundo que os rodeia como também se mostravam mais disponíveis para a aquisição de novos conhecimentos. O seu sucesso é, por um lado, devido ao esforço investido nos estudos e, por outro, na consciencialização de um mundo exigente.

A participação em concursos deste género permite uma abertura de horizontes vedada aos que ficam na comodidade e na letargia. Estes alunos tiveram a oportunidade de, ao longo destes anos, participarem em sessões distritais, onde, com colegas da sua região, debatiam e se debatiam com jovens de realidades e experiências idênticas. Participaram também em sessões nacionais (Assembleia da República – Parlamento dos Jovens, seis vezes e na região do Porto – Entre Palavras – sete) onde a realidade nacional é confrontada com as condições e as diferenças da interioridade. Participaram também em sessões europeias, no Parlamento Europeu em Estrasburgo (duas vezes), onde se confrontaram com a panóplia de culturas e de línguas.

O contato com outros jovens, do distrito, do país ou da União Europeia, com objetivos e experiências distintos, permite aos alunos a confirmação de que, mesmo sendo bons na sua localidade, o mundo tem horizontes mais amplos e que é necessário ser-se ainda maior para estar ao lado de outros jovens que têm outros desafios e outras condições para singrarem na vida.

A educação não formal pode ser um pilar no sucesso do indivíduo, pois, por ela, poder-se-ão descobrir novas vocações ou aprofundar itinerários que, por si só, a educação formal dificilmente o conseguiria fazer. O cidadão não é, e nem pode ser, apenas uma formatação de um curriculum nacional. Para além desse importante e significativo curriculum, cada indivíduo terá de encontrar informação e atividades complementares que lhe permitam entender o mundo que o rodeia de uma forma muito pessoal e crítica. É este alcançar de novos horizontes que proporciona a jovens como o Joel Moriano, aluno do 3º ano do curso de Direito na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, proferir: Experiências como o Entre Palavras, Parlamento dos Jovens, Juventude em Ação transmitem ensinamentos de certa forma indiscritíveis, e certamente inatingíveis por quem nunca tentou sequer participar neles. Em termos cívicos e políticos aprende-se, acima de tudo, a respeitar a opinião daqueles que discordam das nossas ideias, a argumentar de forma coerente com aquilo que defendemos, a pôr-nos na posição do adversário para saber como e com o quê irão contra-argumentar. Em termos educacionais todas estas aventuras ajudam a criar uma maior empatia e confiança com os docentes que nos acompanham, mantendo sempre o respeito que deve estar inerente à relação professor-aluno.

Em suma, a educação formal transmite conhecimentos e formação académica aos discentes, mas é acima de tudo a educação não formal que forma cidadãos ativos e conscientes dos seus direitos e deveres cívicos.

Por seu turno, e muito na mesma linha, a Ana Tomatas, aluna do 3º ano do curso de Ciência Política e Relações Internacionais na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, afirma:

Fiz parte de uma geração, de uma escola, de uma “fornada” de alunos motivados e inspirados, onde saber mais era o principal. Crescer a nível escolar não é só estar sentada à frente de um professor a debitar matéria; não é só fazer os trabalhos de casa; não é só (continuo) ir para o recreio e sentar-me a comer o pãozinho e falar sobre tudo e nada. Aprender e saber é para além da escola, para além das quatro paredes de aula.

A partir do 8º ano tive essa oportunidade. Começava no Entre Palavras. Seguiu-se o Parlamento dos Jovens, Jovens Repórteres, e outros tantos. As tardes livres eram passadas em grupo na biblioteca a escrever, a pesquisar, a rir, a aprender mais sobre tantos temas que até um certo momento nos são completamente alheios. No Parlamento dos Jovens, convocávamos uma noite onde pais, docentes e amigos eram convidados a assistir ao debate que trocávamos, fruto de toda uma pesquisa e conhecimento de causa.

O mérito nem sempre é reconhecido, nem sempre é a nós que compete ganhar. E essa é outra componente importante da vida, que aprendemos a dar valor, ainda mais valor. Sabemos que se não ganhámos, não devemos ter um mau perder, não devemos ficar com fúria, mas aceitar porque, na verdade, a aprendizagem e o convívio compensam a não-vitória. Não posso deixar de ser falsa também ao ponto de dizer que não entrei em êxtase quando ganhei (eu e os meus colegas) o Entre Palavras e passamos dois dias fora da nossa vila, quando fomos a Portimão outros tantos dias, a Lisboa, Ovar e… Estrasburgo! Foi no 12º ano e o culminar de todas as participações, pois era a última: uns dias fora, com os professores e amigos, não se podia pedir mais.

E é isto fazer parte de um grupo, de vários grupos onde as palavras de ordem são “motivação, interesse, saber, participar, rir e aprender”. A educação não-formal foi um marco muito importante para mim, para me ajudar na decisão do que fazer no futuro. Estou no último ano da licenciatura de Ciência Política e Relações Internacionais e, sem dúvida, que todos os temas, que todos os momentos foram importantíssimos para minha formação, a nível de saber de escola (da matéria), mas, principalmente, a nível da cultura, algo que é essencial adquirirmos ao longo do tempo, cada vez mais.

É por estes exemplos que as escolas, sempre muito preocupadas com os rankings e com o cumprimento de objetivos, deveriam apostar neste tipo de projetos, sabendo que, com o tempo, o investimento trará um retorno considerável, mesmo tendo consciência que o público-alvo ainda é bastante restrito.

Cabe às estruturas de chefia saber criar ambientes propícios para que tanto alunos como professores possam investir paralelamente na educação não formal, como uma parceira para a melhoria significativa da educação formal.

 

Estrasburgo – Parlamento dos Jovens (Euroscola)

Braga – Entre Palavras

Assembleia da República – Parlamento dos Jovens

 

* Professor da Escola Secundária de Campo Maior e responsável pelos projetos Entre palavras e Parlamento dos Jovens.