Capa | Revista 01 | Revista 02 | Revista 03 | Revista 04 | Revista 05

MENU


Editorial

- Educar Sempre -

Certificação em TIC

Prevenção do bullyng

Eu e os Outros

InspiraTIC

Literatura Infantil

Motivação e Aprendizagem

Desenvolvimento Profissional

Dicionário Terminológico

Articulação Pedagógica

O Conselho Geral

O Papel da Formação

Formação de PND

 

A Minha Escola

Crónicas de Aprender

Entrevista

Notícias

Cartoon


 

 

 

Literatura Infantil e a técnica do voo

Teresa Mendes Mergulhão
Escola Superior de Educação  do Instituto Politécnico de Portalegre

Devido a diversos factores de ordem histórica, social, cultural e até económica, a literatura infantil, durante muito tempo marginalizada, subalternizada em relação à literatura para adultos e entendida como forma literária menor, encontra-se hoje perfeitamente legitimada e validada pelo cânone, tendo adquirido um estatuto próprio e um lugar de pleno direito no interior do polissistema literário, com inevitáveis repercussões ao nível da cena editorial.

 Com efeito, a actual proliferação de obras de irrepreensível qualidade estético-literária especialmente endereçadas ao público infantil demonstra a vitalidade e o dinamismo deste subsistema semiótico específico, bem como a crescente preocupação de autores, ilustradores e editores em oferecer às crianças livros de verdadeira pregnância significativa e de profunda coesão intersemiótica que provoquem deslumbramento e lhes despertem o gosto pela leitura, proporcionando, simultaneamente, o desenvolvimento da imaginação e do pensamento divergente, a modelização do mundo e a construção de universos simbólicos, alternativos ao real.

Para além disso, tais obras, marcadas pela originalidade e pela fuga ao estereótipo, e sobretudo pela natureza plurissignificativa dos textos e das imagens que as configuram, permitem ainda ampliar a capacidade interpretativa da criança, desafiando-a a desocultar sentidos e aventurar-se pelos caminhos do inefável, pessoalizando dessa forma a significação textual com a sua particular forma de ver e de sentir.

Assim se compreende que o contacto sistemático com o livro de qualidade estético-literária deve ser promovido e cultivado o mais precocemente possível, cabendo ao adulto-mediador a enorme responsabilidade de ler e dar a ler textos e imagens imbuídos de uma dimensão imaginante e artística que alarguem as opções de leitura e desenvolvam a sensibilidade estética da criança (pré)leitora.

As actividades de promoção e animação de leitura, essenciais na captação de potenciais futuros leitores fluentes e comprometidos com o acto de ler, favorecem claramente o interesse e o gosto da criança pelo livro, mas é fundamental que se exercite a compreensão da leitura de textos literários (e das ilustrações artísticas que os complementam e iluminam) em contexto educativo por forma a garantir o desenvolvimento da capacidade interpretativa e da competência leitora dos mais novos.

Nesse sentido, a leitura literária deve instituir-se como uma prática significativa e recorrente em sala de aula, em todos os níveis de escolaridade, uma vez que favorece o espírito crítico, desperta o interesse e o gosto da criança pela beleza da linguagem poética e pela descoberta de sentidos implicados no texto. Efectivamente, ao aceder, pela mão do adulto-mediador, à estrutura profunda do texto, a criança leitora assume-se como criadora do universo textual (e pictórico), preenchendo os espaços em branco e atrevendo-se a encetar uma aventura enunciativa de intensa cooperação interpretativa.

Ora, justamente, a participação activa do leitor infantil neste dinâmico processo hermenêutico de interpretação do lido afigura-se imprescindível para estabelecer os alicerces de uma verdadeira competência leitora que facilitará a entrada gradual na literatura adulta, porque a criança, nomeadamente através do desenvolvimento da sua capacidade inferencial, aprende a desautomatizar o seu olhar e a percorrer os trilhos que lhe são propostos ou insinuados, quer pelo texto quer pelas ilustrações. Desta forma, ao adulto-mediador compete desencadear mecanismos pedagógicos que, ao invés de promoverem a mera instrumentalização da leitura, facilitem, simultaneamente, o processo de fruição estética e a atribuição de sentidos ao narrado. Porque, como afirma José Morais:   

Ler é alimentar-se, respirar. É também voar. Ensinar a leitura é ao mesmo tempo formar a criança na técnica do voo, revelar-lhe este prazer e permitir que o mantenha.

José Morais