PROFFORMA

REVISTA ONLINE DO CENTRO DE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DO NORDESTE ALENTEJANO

 

 

 

 

 

Quando o longe se fez perto…

Elisabete Simões Rasquete
Agrupamento de Escolas N.º 1 de Elvas

Há treze meses que vivemos sob uma pandemia. Algo que não equacionávamos, para o qual não estávamos preparados, individual e socialmente. Subitamente, todo o nosso mundo sofreu uma reviravolta e fomos obrigados a uma adaptação, o que implicou uma reestruturação do nosso pensar e agir. É nesta capacidade de adaptação que a escola se distingue. É sobre a escola que vos vou falar.

Uma escola é muito mais do que um edifício onde, diariamente, muitos entram. Uma escola é um ecossistema pleno de idiossincrasias. Um mundo de descoberta individual e coletiva, de aprendizagem, de saberes construídos, de criatividade e de emoções.

Quando, em março de 2020, soubemos que teríamos de ficar em casa, o ensino remoto de emergência (é esta a denominação que prefiro) foi o caminho possível. Um caminho repleto de obstáculos, mas também de gratificantes surpresas e prémios. Toda a comunidade escolar sabe que nada substitui a presença, a proximidade física, os afetos que dela advém, a sociabilização tão fundamental ao crescimento pessoal. Mas, durante meses, tal não foi possível. A escola saiu de si e reinventou-se. Os professores, acredito firmemente, deram tudo e transformaram o nada em muito. Os alunos, com a sua extraordinária capacidade de absorver e adaptar, criaram o seu “mundo novo”. Entre quatro paredes, em frente de um écran, o qual foi transcendido por um apoio e companhia que se fizeram diários. Muitos sem equipamentos e recursos, sem condições físicas, sem apoio familiar. Outros com tudo isso e mais. As desigualdades, que sempre existiram, tornaram-se visíveis aos olhos de muitos que continuam a não perceber quão basilar é a educação numa sociedade, que se quer equitativa e justa. Não foram criadas pelo ensino remoto, existem desde sempre, porque a linha de partida não garante igual lugar a todos.

Diariamente, o desafio foi sendo superado. A cada dia, os nossos alunos mostraram-nos a sua resiliência, a sua infinita capacidade de nos surpreender. As aprendizagens foram inequívocas, por muito que insistam em rotular o ensino remoto como um fracasso. Essa rotulagem desmerece o trabalho, o empenho, a dedicação de todos os intervenientes neste processo tão complexo que é ensinar e aprender. Discutem-se aprendizagens perdidas, mas não se fala de tantas que foram adquiridas. Debatem-se avaliações e classificações, prolonga-se o ano letivo, insiste-se em quantificar tudo o que se faz, em reduzir percursos a momentos. Esta não é, não pode ser a escola que almejamos. A escola que queremos, pelo qual lutamos, é uma em constante movimento, que garante as mesmas oportunidades a todos,

O ensino remoto foi, em si só, uma aprendizagem. Uma que nos levou a refletir, a questionar, a inovar e a criar. A tecnologia é o que nos permite nunca estar distantes. Não é um fim, mas um meio para o atingir. Todas as ferramentas digitais de que dispomos, todos os recursos que criamos ou adaptamos, todas as metodologias e estratégias que utilizamos são oportunidades, nunca obstáculos. Foram e são oportunidades para questionarmos os fundamentos das nossas práticas letivas, para refletirmos sobre a efetiva diferenciação de processos de aprendizagem, em busca de um verdadeiro trabalho colaborativo e de uma autonomia construída sobre alicerces sólidos.

 Pessoalmente, o ensino remoto foi uma experiência muito gratificante. Apesar das muitas horas em frente a um écran, apesar do muito trabalho acrescido e apesar de ter muitas saudades dos meus alunos e colegas, nunca poderei considerar este tempo como perdido. Cresci enquanto pessoa e profissional. Aprendi todos os dias, numa descoberta incessante do que considero ser a essência da escola. Como professora, não me limito a transmitir conteúdos ou a replicar conceitos. Os alunos podem obter as informações que precisam com muita facilidade, pelo que o meu papel é o de orientar, o de promover uma utilização eficiente e criteriosa da informação. Devo ser capaz de os ajudar a desenvolver as competências do século XXI, de forma que adquiram e consolidem saberes sociais e profissionais, que possam aplicar com confiança na e para lá da escola. A capacidade de inovar, de resolver problemas e implementar soluções, implica uma escola que fomente a criatividade, o pensamento crítico, a inteligência emocional, competências e valores essenciais para viver num mundo globalizado e interligado. As tecnologias digitais permitem uma interação sem precedentes, mas o foco não deve ser nas tecnologias e sim nas suas potencialidades.

Acredito que, durante o ensino remoto, os meus alunos adquiriram mais autonomia, tornaram-se mais confiantes, trabalharam colaborativamente e em rede, consciencializaram-se das suas potencialidades e também das suas limitações. Esta consciencialização é muito relevante na construção da aprendizagem, pois ajuda-os a definir quais as abordagens mais adequadas. As aprendizagens foram diárias e ultrapassaram em muito o currículo da disciplina, promoveram a descoberta, a pesquisa, a participação e o envolvimento num processo em que os alunos são o vetor principal. A minha prática teve como pressuposto os princípios inerentes à sala de aula invertida. Os alunos tiveram acesso a recursos diversos e apelativos, que os levaram à descoberta de novos conceitos e conteúdos. Apropriaram-se dos mesmos e, nas aulas síncronas, concretizavam essa apropriação em várias atividades que, numa língua estrangeira, privilegiam a interação e produção oral. Desenvolveram pequenos projetos, aprenderam a utilizar uma plataforma educativa, interagiram diariamente com os colegas e professores. Criaram Powerpoints, Padlets, áudios e vídeos com ferramentas que já dominavam, como o Whatsapp ou o YouTube. Perceberam a importância de cumprirem as regras de segurança online. E foram avaliados diariamente pela sua prestação, pelo seu envolvimento, pelos trabalhos apresentados e pela multiplicidade de pequenas coisas que comprovaram o processo, mais do que o produto final. Aprenderam e esse percurso vai continuar.

Estes foram tempos de mudança. Nada voltará a ser o que era e a escola renova-se a cada dia.