PROFFORMA

REVISTA ONLINE DO CENTRO DE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DO NORDESTE ALENTEJANO

 

 

 

 

 

E@D, entre o mais que nos une e o menos que nos separa…

Cristina Sala e Ana Reis
Agrupamento de Escolas de Arronches

A escola, espaço físico de acolhimento, organizado e planeado para vivenciar ao longo dos dias, semanas e anos das nossas vidas de forma integradora e sem grandes sobressaltos, mudou!

E que mudança!

A mudança que desde sempre esteve aliada à escola, aconteceu sem que nada o pudesse prever ou acautelar.

De súbito, a comunidade escolar recolheu-se em casa, qual larva no casulo. Sem preparação prévia, poucos recursos, baixos níveis de literacia digital, amedrontada mas com a resiliência que a caracteriza, a Escola reinventou-se durante um fim-de-semana de 13 de março de 2020…

Perante o inesperado, sobrepôs-se a certeza na urgência de encontrar formas de comunicação eficazes, preferencialmente com recurso ao digital, já que a pandemia bloqueara os contactos presenciais e próximos.

Como comunicar? Que plataforma utilizar, que recursos privilegiar, como aprender, como ensinar, como ver e sentir cada aluno? Havia que garantir que ninguém ficaria pelo caminho, conscientes da hercúlea tarefa que tínhamos a nosso cargo.

Nos dias em que ainda se discutia a declaração de pandemia com a possibilidade de uma quarentena planetária e a irrealidade das notícias nos surpreendia diariamente, os professores procuravam estabelecer um fio-de-prumo para os seus alunos, reforçando a importância do estudo, o valor da escola, o papel das rotinas…

….Software, plataforma, síncrona, assíncrona, classroom, videoconferência, zoom, avaliação online, email vieram renovar o nosso léxico.

Encerrámos o período com aulas síncronas  via Zoom e trabalhos enviados via email. Prontamente estas práticas se mostraram pouco seguras e eficazes, pelo que o período de interrupção letiva da Páscoa foi aproveitado para testar e selecionar nova plataforma, inscrever toda a comunidade escolar (alunos, pessoal docente e não docente, técnicos) na mesma, experimentar e partilhar formação com a docente de TIC, construir um Plano de Trabalho E@D, partilhar com os pais / encarregados de educação e alunos através dos respetivos diretores de turma.

Foram prioritariamente identificados todos os alunos que não tinham computador, tablet, webcam ou acesso à internet. A escola disponibilizou computadores portáteis e tablets; a autarquia os hotspots móveis necessários.

 

 

1. Inquérito aos alunos, questionários de monitorização do E@D. 2019-2020.

 

Quando tudo parecia desabar e a escola fechou, os docentes revelaram o seu profissionalismo e resiliência colaborando entre si, articulando práticas, experimentando a inovação imposta e respondendo às inquietações de pais e alunos. Todos vimos os nossos papéis alterados e a terrível pandemia abriu-nos uma janela em cada lar…uma janela de espelho onde podíamos observar e ser observados. Todos precisam de todos.

O vírus acentuou a importância desta colaboração de proximidade, mas simultaneamente expôs fragilidades e inseguranças. 

Professores duplamente comprometidos e alunos com acesso às aulas online, iniciam o 3º período, com um horário organizado no período da manhã com aulas síncronas e assíncronas através do Google Classroom e Meet com Google Sala de Aula. Para melhor coordenar as atividades letivas, os conselhos de turma reuniam semanalmente, facto vantajoso na rápida identificação de constrangimentos e suas soluções.

Ao longo do primeiro momento de confinamento, foram identificadas dificuldades, principalmente no 1º ciclo de escolaridade, cujos alunos tendo menos autonomia, careciam de acompanhamento permanente em casa, supervisionando a utilização da plataforma e a realização das tarefas diárias. Com o uso predominante do email, a colaboração dos pais foi inestimável e excedeu as expectativas. Muitos foram os que adquiriram equipamentos para auxiliar os seus educandos.

Nas raras situações de habitações isoladas, em que os alunos não tinham rede, organizou-se uma sala de estudo com apoio da junta de freguesia, que não só os transportava para que usufruíssem do E@D, como ainda lhes oferecia o lanche da manhã.

Os professores disponibilizaram ainda um horário semanal para prestar apoio aos alunos na realização de tarefas e dificuldades de aprendizagem, o que foi considerado um aspeto muito positivo por pais/encarregados de educação e alunos.

 

 

2. Inquérito aos Encarregados de educação, questionários de monitorização do E@D.

 

Até ao final do ano letivo, a escola superou constrangimentos. O trabalho colaborativo e a partilha constante entre docentes, mostrou-se eficaz na implementação do ensino à distância, cumpriram-se os objetivos inerentes ao processo de ensino/aprendizagem, possibilitando a interação entre professores, alunos e pais ou encarregados de educação.

Ninguém se perdeu nos trilhos desta viagem sem bússola.

Isso fortaleceu-nos e, como afirmava José Régio, este foi “um tempo de desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!

No final de um ano letivo tão atípico, foram realizados inquéritos direcionados a professores e técnicos especializados, alunos e encarregados de educação, para monitorização do processo. Os resultados obtidos em conjunto com os relatos experienciados dos professores ao longo das reuniões semanais de conselhos de turma, apontaram indicadores no sentido da melhoria na reorganização das estratégias a adotar. Sublinhámos a identificação dos alunos com mais dificuldade de concentração e interpretação das tarefas, dificuldades decorrentes de problemas técnicos como falhas ou lentidão da internet que os desmotivavam, dificuldade de adaptação às tecnologias… Os apoios e tutorias presenciais aos alunos com medidas de suporte à aprendizagem não voltariam a ser à distância.

A avaliação dos alunos implicou um reforço no que já era uma prática da escola, tendo em conta os Princípios Orientadores para uma Avaliação Pedagógica em Ensino a Distância (E@D) emanados pelo Ministério da Educação, tais como fazer pontos da situação com frequência, dar feedback constante ao aluno sobre o seu desempenho salientando aspetos positivos ou a melhorar, diversificar tarefas, procedimentos e instrumentos de recolha de avaliação, definir objetivos claros e sistemáticos.

Os resultados obtidos foram indicadores úteis para posterior melhoria das aprendizagens e reorganização de metodologias de trabalho.

O gráfico seguinte retrata a auto-avaliação dos alunos no respeitante à aquisição/ desenvolvimento de competências tendo por base o pressuposto do perfil do aluno.

 

3.            Monitorização final do E@D, inquérito, aos alunos 2019-2020

 

4.            Monitorização final do E@D, inquérito, aos alunos 2020-2021

Na análise SWOT efetuada, alunos e encarregados de educação destacaram como pontes fortes, os recursos disponibilizados, o apoio permanente dos professores, a adequação do trabalho realizado, a diversificação dos instrumentos de avaliação, o processo formativo da avaliação com constante feedback sobre a evolução das tarefas propostas e realizadas pelos seus educandos. Valorizaram igualmente o contacto anterior dos alunos com as novas tecnologias e os conhecimentos informáticos adquiridos.

Como constrangimentos, sobressai a necessidade de aquisição de equipamento informático para garantir o E@D aos educandos; o pré-escolar e 1º ciclo com uma percentagem elevada no recurso aos tablets, evidenciou a necessidade de apoio na realização de atividades o excesso de trabalhos/atividades disponibilizados e um esforço acrescido na concretização das aprendizagens.

O "#EstudoEmCasa", promovido pelo Ministério da Educação, forneceu acesso a recursos de aprendizagem divulgados através de programas na rede pública de televisão visando alunos do ensino básico e que contou com um conjunto de informações sobre o seu funcionamento, para pais e professores. O recurso a este programa por parte dos professores teve maior incidência nas turmas do pré-escolar e do 1º ciclo.

No mundo fora da escola, o do distanciamento social (seja por COVID_19, seja por indiferença…), existem os alunos cujo contexto familiar é composto por pessoas que querem e podem ficar em casa, trabalhar a partir de casa, manter a esperança em casa e continuam também a existir os alunos cujas famílias não têm casa, não têm trabalho e, pouco a pouco, vão perdendo a esperança. São mundos com expectativas diferentes face ao impacto do que a escola pode ser nas suas vidas. E a escola subsiste, gerindo os mundos que dela exigem resultados académicos, resultados sociais, resultados pessoais, apoio psicossocial e assistencial, promoção da saúde e da vida saudável, integração cívica, práticas de cidadania …

Duas observações foram imediatas: os bons alunos conseguem, com pouco esforço, acompanhar os assuntos e as atividades; os alunos com algumas ou maiores dificuldades, muito dificilmente o fazem. Respondem pouco ao apelo de atenção e trabalho. E, muito rapidamente, divagam.

Neste contexto, o apoio dos pais durante o encerramento da escola foi um fator preditor do sucesso neste processo.

A valorização e partilha de recursos, assim como a prática transversal no uso das TIC, foram essenciais e determinaram a continuidade na utilização da plataforma de aprendizagem utilizada no primeiro momento de confinamento e, simultaneamente no ensino presencial.

 

                “ Aprende-se a fazer, fazendo. Mas também reflectindo. À luz do que já se sabe. Com vista à ação renovada”. Alarcão (1996)

 

Neste último confinamento, a transição foi facilitada, pois toda a estrutura estava montada. Todos tinham tido oportunidade de melhorar os seus conhecimentos digitais, a professora de TIC garantiu aulas de utilização da plataforma aos alunos mais novos e com menos competência digital, e ao longo do 1º período a mesma foi utilizada como ferramenta de trabalho e apoio.

 

5.            Monitorização final do E@D, inquérito, aos alunos 2020-2021

A escola deu continuidade e melhorou os apoios prestados aos alunos que ainda não tinham acesso a recursos de aprendizagem digital.

 

6.            Monitorização final do E@D, inquérito, aos E.E. 2020-2021

Como prevenção para alunos em risco, e para os alunos que beneficiam de adaptações curriculares significativas, a escola possibilitou para os primeiros, salas para acompanhamento das aulas online com supervisão e tutorias; para os segundos, aulas presenciais com os professores de Educação Especial e de apoio educativo em articulação com os professores titulares das disciplinas.

A candidatura ao Plano de Desenvolvimento Pessoal, Social e Comunitário teve como grande objetivo a mitigação das “desigualdades socioeducativas, garantindo o acesso ao conhecimento como a chave para a mobilidade social e o êxito educativo de todos e cada um dos alunos, contrariando o absentismo e o abandono”. Inscrevemos duas medidas e vimo-las aprovadas. A afectação de um terapeuta da fala e uma educadora social, em conjunto com a psicóloga da escola gerou sinergias que não poderão  ser dispensadas.

 

 

 7.            Monitorização final do E@D, inquérito, aos alunos 2020-2021

 A escola foi igualmente resposta de acolhimento para quem necessitou. Desta forma implementou o almoço takeaway, garantindo uma resposta necessária para muitos…

A nível da educação pré-escolar o acompanhamento passou a ser feito diariamente com aulas síncronas através da plataforma e necessariamente com apoio parental. Os pequeninos que tinham que vir à escola, esboçavam sorrisos bem rasgados e olhares brilhantes quando o rosto da educadora e dos colegas surgia no quadro interactivo da sala.

Findo o confinamento, a equipa de avaliação interna lançou novamente os inquéritos de monitorização do processo E@D.

Atendendo às necessidades de professores e alunos, pudemos mais uma vez constatar que a aprendizagem online foi eficaz tendo em consideração fatores como a diversificação de metodologias e recursos, interação aluno-professor, interação entre pares, estratégias pedagógicas, eficácia da comunicação online, valorização da avaliação online e seu feedback.

Comparativamente com a experiência anterior, a análise SWOT veio consolidar todo o investimento feito e as respostas obtidas validaram o esforço e as melhorias introduzidas no plano de E@D 20_21.

A descrição aqui feita, reforçou em todos a ideia de que apesar dos resultados observados, “nenhuma máquina substitui um professor”.

Todos os papéis foram alterados, mas a verdadeira escola é uma escola de partilha, de construção do saber com base na relação pedagógica, no cruzamento de olhares, na afectividade e no crescimento. A escola, na pandemia, acentuou as desigualdades sociais, tal como refere Boaventura Sousa Santos:

 “(...) a quarentena não só torna mais visíveis, como reforça a injustiça, a discriminação, a exclusão social e o sofrimento imerecido que elas provocam…

A distância exigiu mais autonomia e mais responsabilidade, mais trabalho, mais cansaço, tornando a escola mais difícil. Disso nos dá nota, o gráfico seguinte:

 

 

8.            Monitorização final do E@D, inquérito, aos alunos 2020-2021

 O mundo foi forçado a mudar. A educação também precisará reescrever o seu rumo. É urgente preparar os alunos com as competências cognitivas, criativas, sociais e emocionais que lhes serão exigidas daqui para a frente. Esse é um importante desafio para orientar o futuro. Diz-se que toda a crise vem acompanhada de oportunidade. Também os desafios incentivam a inovação. A escola depois desta pandemia será diferente. Diferente deverá ser o nosso modelo mental, alinhando-o com um modo mais resiliente, criativo e progressivo. As escolas públicas desempenham um papel crucial na promoção das competências necessárias para se ter sucesso no mercado de trabalho em rápida mudança e na igualdade de oportunidades de desenvolvimento para os jovens. O grande e importante desafio será a escola contribuir para minimizar diferenças e oferecer oportunidades para que todos possam aprender, desenvolver-se e prosperar no presente e no futuro. Para o conseguir, a escola terá que se tornar ainda mais flexível, mais inclusiva e fiadora de mais equidade.