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Ainda a propósito da avaliação externa da dimensão científica e pedagógica do desempenho docente

Francisco Simão
CEFOPNA

Com a publicação do Decreto Lei nº 41/2012, de 21 de Fevereiro, mais conhecido por Estatuto da Carreira Docente (ECD), o Ministério da Educação consagra a dimensão externa da avaliação de desempenho docente (ADD), a qual, apenas de forma incipiente e precária figurara no modelo anterior.

No art.º 40º daquele diploma definem-se assim os objetivos da ADD:

3 - Constituem ainda objectivos da avaliação do desempenho:

a) Contribuir para a melhoria da prática pedagógica do docente;

b) Contribuir para a valorização do trabalho e da profissão docente;

c) Identificar as necessidades de formação do pessoal docente;

d) Detectar os factores que influenciam o rendimento profissional do pessoal docente;

e) Diferenciar e premiar os melhores profissionais no âmbito do sistema de progressão da carreira docente;

f) Facultar indicadores de gestão em matéria de pessoal docente;

g) Promover o trabalho de cooperação entre os docentes, tendo em vista a melhoria do seu desempenho;

h) Promover um processo de acompanhamento e supervisão da prática docente;

i) Promover a responsabilização do docente quanto ao exercício da sua actividade profissional.

4 -A regulamentação do sistema de avaliação do desempenho estabelecido no presente estatuto é definida por decreto regulamentar.

 

No mesmo dia 21 de fevereiro de 2012 é publicado o Decreto Regulamentar que enquadraria todo o esquema conceptual que regularia a avaliação de desempenho docente, o Dec.-Reg. Nº 26/2012.

A relevância da ADD é determinante para a carreira docente, de acordo com o consignado no art.º 41º do ECD:

1 - A avaliação do desempenho é obrigatoriamente considerada para efeitos de:

a) Progressão na carreira;

b) Conversão da nomeação provisória em nomeação definitiva no termo do período probatório;

c) Renovação do contrato;

d) Atribuição do prémio de desempenho.

 

E, finalmente, o fulcro da questão principal e aquele em que centraremos a nossa atenção, o âmbito da ADD, em particular na dimensão da avaliação externa, conforme o consigna o art.º 42º do ECD:

8 - A avaliação tem uma natureza interna e externa.

9 - A avaliação interna é efetuada pelo agrupamento de escolas ou escola não agrupada do docente e realizada em todos os escalões.

10 - A avaliação externa centra -se na dimensão científica e pedagógica e realiza -se através da observação de aulas por avaliadores externos, sendo obrigatória nas seguintes situações:

a) Docentes em período probatório;

b) Docentes integrados no 2.º e 4.º escalões da carreira docente;

c) Para atribuição da menção de Excelente, em qualquer escalão;

d) Docentes integrados na carreira que obtenham a menção de Insuficiente.

 

A aplicação efetiva desta legislação decorreu nos anos letivos de 2012/2013 e 2013/2014, naturalmente suportada num conjunto de diplomas legais entretanto publicados, ao longo de 2012 e no início de 2013, que enquadraram, regulamentaram e aclararam situações específicas. O Ministério da Educação promoveu a organização de um aparelho que tem vindo a garantir a operacionalização de todo o processo de avaliação externa dos docentes, suportado na rede de Centros de Formação de Associação de Escolas (CFAE), sob a direção da Direção Geral da Administração Educativa (DGAE) e a tutela da Secretaria de Estado da Educação e da Administração Escolar (SEEAE).

Ao longo destes dois anos, em todo o Alentejo, cerca de 340 docentes (de um total nacional de cerca de 3600) foram avaliados por avaliadores externos na dimensão científica e pedagógica em cerca de 700 aulas (de um total nacional de 6500), num total de 180 minutos por cada um.

Para concretizar esta ação foram envolvidos 267 avaliadores externos, selecionados a partir de uma base de dados organizada por CFAE, onde constavam todos os docentes que nas escolas reuniam as condições e pré-requisitos profissionais e académicos consignados na legislação para o exercício desta função. Antes do processo ser iniciado, estes avaliadores externos (AE) tiveram formação específica para o exercício da função que deles iria ser requerida, ao longo de várias horas, por especialistas recrutados em todo o país pela DGAE e afetos aos vários CFAE, regionalmente, para assegurarem esta formação, o acompanhamento e apoio aos AE e aos CFAE, e também às escolas sempre que os diretores entenderam necessitar.

As condições em que esta ação decorreu foram extremamente condicionadas pelo contexto social, político e económico que se viveu no país ao longo destes anos, 2012/2014, quer do ponto de vista da generalidade do contexto nacional, quer, em particular, do ponto de vista da carreira docente, congelada desde 2010. Ainda assim, decorreu no Alentejo de uma forma notavelmente calma e sem percalços de maior. Contudo, e para quem acompanhou de bastante perto todo este processo e o conheceu desde a génese do planeamento ao processo de implementação, quem lidou com as pequenas dúvidas, com as incoerências que surgem na aplicação contextualizada no terreno, várias questões se colocam relativamente à forma e à eficácia, ao sentido e aos objetivos, que um processo de avaliação de desempenho docente deve revestir. Naturalmente que não podemos nunca separar este, ou qualquer processo de avaliação docente, de um processo supervisivo, que, em si mesmo, definirá uma boa parte do sentido e do objetivo do processo avaliativo. E, no entanto, ainda que o ECD defina como objetivo da ADD “promover um processo de acompanhamento e supervisão da prática docente” (al. h, nº 3, artº 40º), e remeta para a avaliação externa essa função essencial, a regulamentação da lei e a operacionalização da mesma, remete o processo supervisivo para uma dimensão absolutamente incipiente e inócua quando levada mais longe pelos atores mais bem intencionados.

Os pré-requisitos para a função de AE, tal como estão definidos no art.º 2º do Despacho Normativo nº 24/2012, de 26 de Outubro, são:

2 - A bolsa de avaliadores externos a que se refere o número anterior é composta por docentes de todos os grupos de recrutamento que reúnam cumulativamente os seguintes requisitos:

a) Estar integrado no 4º escalão ou superior da carreira docente;

b) Ser titular do grau de doutor ou mestre em avaliação do desempenho docente ou supervisão pedagógica ou deter formação especializada naquelas áreas ou possuir experiência profissional no exercício de funções de supervisão pedagógica que integrem observação de aulas.

 

Ainda assim, o número de docentes que encontrámos nas escolas do Alentejo que, cumulativamente, integrassem, pelo menos, o 4º escalão da carreira, isto é, a experiência de tempo de serviço mínima requerida, e possuíssem formação académica adequada foi reduzido e a maior parte dos docentes selecionados possuíam apenas a experiência que lhes conferira a condição de avaliadores nos ciclos de avaliação anteriores (2007/2009 e 2009/2011), a condição de orientadores de estágio ou outras equivalentes.

De uma maneira geral, os CFAE tentaram acautelar o perfil dos AE, mas a amplitude que a lei e a necessidade contextual conferiram ao processo, limitou qualquer ação mais substantiva, e assim, embora o processo se tenha sempre desenrolado no estrito respeito pela letra e pelo espírito da lei, ficam-nos questões que se prendem com a formação adequada e necessária, apesar ter sido implementado um processo formativo que acompanhou os AE ao longo dos dois anos de implementação do processo, em 5 momentos, num total de 25 horas, assegurado por formadores da DGAE; o perfil e adequação profissional dos AE, pois nalguns grupos de recrutamento foram detetados problemas específicos de adequação dos AE aos avaliados, nomeadamente pela natureza das funções desempenhadas, muitas vezes divergentes do grupo original de recrutamento; a contextualização específica da função de AE, enquanto integrante da carreira docente, contemplada em sede de horário do docente, o que lhe conferiria um estatuto mais consentâneo com a função de avaliador e supervisor; e, naturalmente, toda a coordenação que mais não tem sido do que um esboço, entre o processo de avaliação externa e avaliação interna, em que as Secções de Avaliação de Desempenho Docente (SADD) dos Conselhos Pedagógicos quase ignoram o que se passa a montante, isto é, o que se refere à avaliação externa.

Embora ainda que de forma muito extensiva e pouco focada, esta é a questão que se coloca, a implementação do processo de avaliação externa da ADD, nos seus dois primeiros anos, as virtualidades que lhe confere o modelo definido no ECD e no Dec.-Reg. Nº 26/2012, mas também as vicissitudes e constrangimentos de que tem enfermado, fruto das imprecisões conceptuais e legislativas, mas também do contexto que vivemos no sistema educativo e no país. E também, enquanto modelo de avaliação do desempenho docente, pela sua especificidade idiossincrática, de que forma a dimensão supervisiva deste modelo tem sido esquecida, ignorada ou, pura e simplesmente é inexequível ou inadequada – porque, mesmo quando não é expresso desta maneira, esta tem sido a maior queixa que ouvimos do processo, resumida na simples pergunta que todos colocamos: avaliar para quê? De que serve esta avaliação? Que efeitos vai produzir?

Em toda a área desta região, que se reparte por 4 distritos, Évora, Beja, Portalegre e parte do distrito Setúbal existem 100 escolas e agrupamentos de escolas, agregados a 7 CFAE: 2 no distrito de Portalegre, 2 no distrito de Évora, 2 no distrito de Beja e 1 no distrito de Setúbal. Todo o processo de operacionalização e execução da avaliação externa foi coordenado pelos CFAE na região Alentejo, que, na sua superfície, é equivalente a um terço da área continental do país, e na realidade demográfica e social, é absolutamente distinta das restantes 4 regiões do país – Norte, Centro, Algarve e Lisboa e Vale do Tejo.

Acresce ainda que o processo, embora com diretrizes e orientações nacionais e comuns, fundamentadas na legislação e nas orientações superiores, emanadas quer da DGAE, quer da SEEAE, teve particularidades próprias nalgumas das áreas dos CFAE do Alentejo – será, talvez, interessante apercebermo-nos dessas particularidades e das razões que as motivaram.

Por último, gostaria de referir, do ponto de vista pessoal, a necessidade que tenho vindo a sentir, cada vez mais, de aprofundar o conhecimento da realidade da região Alentejo, que, nas suas idiossincrasias, a maior parte das vezes, não se enquadra nas medidas ou orientações definidas e formatadas em Lisboa para todo o país, da forma que a tutela o entende “a la lettre”.

O facto de nos últimos 6 anos ter vindo a exercer a representação e coordenação dos CFAE do Alentejo junto dos organismos centrais do Ministério da Educação tem-me demonstrado que, ainda que de forma não deliberada, a singularidade desta região tem sido muitas vezes diluída no todo nacional, e que a realidade demográfica – que devia ser alvo de um tratamento e atenção de discriminação positiva – é, na maior parte das vezes, agravada pela aritmética cruel da realidade dos números dos censos, sem que as distâncias ou qualquer plano de inversão do caminho que percorremos, venham atenuar este estado de coisas.