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Editorial

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- Entrevista -

 

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Conversando com António Luís Rocha Sequeira, Diretor do Agrupamento de Escolas do Bonfim

Luísa Moreira
CEFOPNA

Recentemente eleito, o Professor António Luís Rocha Sequeira é o diretor do Agrupamento de Escolas do Bonfim, em Portalegre. Neste início de ano, algo conturbado, fomos conversar com ele.

Profforma – Professor Sequeira, o que motiva um jovem professor de filosofia a apresentar um projeto para a direção de um Agrupamento de Escolas?

Bem, talvez por não ser assim tão jovem professor, nem tão pouco ter os anos de serviço suficientes que me permitam ter a estabilidade profissional que desejaria ter numa altura destas. Por isso, a tomada desta decisão não se orientou tanto por um motivo, mais por um móbil. De qualquer forma, ainda que tenha havido uma razão subjetiva inerente a esta ação, ela não foi leviana e o projeto que apresentei não foi meramente performativo, mas foi feito em consciência, baseado na crença de que as propostas que apresentei poderão impulsionar o Agrupamento que dirijo a níveis que são desejáveis por qualquer cidadão, isto é, alunos, pais, professores e tutela.

Profforma – Quais as principais dificuldades que está a encontrar no início das suas funções?

As maiores dificuldades que estou a sentir, neste momento, são as de encontrar um equilíbrio entre as ações pedagógicas a realizar num Agrupamento destas dimensões e as respostas e exigências administrativas que se têm de dar perante tantas solicitações das estruturas intermédias da organização do Ministério da Educação e Ciência. Sinto que estou a prestar um serviço administrativo, mais do que tudo, o que contradiz o Decreto-Lei n.º 75/2008, ao deduzir que a maior responsabilidade seria a pedagógica, sem a qual, refere o diploma, o diretor estaria destituído das suas funções.

Profforma – Como carateriza, de forma sintética, o quotidiano de um diretor de agrupamento de escolas nos dias de hoje?

A resposta a esta questão baseia-se na curta experiência que tenho, que é só de três meses, ainda por cima marcados por uma grande crispação docente que começou precisamente na altura em que assumi as atuais funções. Por isso é natural que a descrição não corresponda de todo ao que é normal acontecer no quotidiano de qualquer diretor. Mas, ainda assim, já me dei conta que a pergunta que me faço todas as manhãs quando vou para a escola é: “o que será que vai acontecer hoje?”. É verdade, parece que não existe uma planificação do trabalho que tenho, mais os meus colegas que estão na direção, mas efetivamente nós temo-la. O que é normal acontecer, é não sermos capazes de a cumprir ou por causa dos imponderáveis, ou porque surge qualquer circunstância imprevista que a anula. De manhã, até às 10.00 horas, está tudo mais ou menos calmo, porque os telefones praticamente não tocam. A partir das 10.00 horas, fica tudo muito agitado, porque os telefones praticamente não param. Para além disso, são os professores que continuamente entram na sala da direção e interrompem, justificadamente umas vezes, injustificadamente outras, o trabalho que estamos a fazer. Desta hora até às 13.00 h, parece que passaram 15 minutos e praticamente não fizemos nada do que tínhamos previsto fazer. O almoço come-se a correr, porque às 14 horas temos de aproveitar o almoço de outros tantos para adiantar mais um pouco o trabalho e, grande parte do tempo, ver o correio e dar-lhe despacho. Depois, voltamos a receber uns quantos colegas e outros tantos telefonemas, até que às 17.30 horas tudo acalma e é quando nós podemos acabar de fazer o que tínhamos tanto de fazer. Por uma questão de disciplina, decidimos na direção não ficar na escola para além das 20.30 horas e, quando saímos, saímos com a impressão de que não fizemos nada, tendo trabalhado tanto.

Profforma – Muitas vezes se diz que o mais difícil na gestão de uma Escola/Agrupamento é a gestão dos recursos humanos, docentes e não docentes. Concorda?

Relativamente a este tipo de gestão o mais difícil de gerir são os impulsos, as emoções e a imprevisibilidade das pessoas. Compreendo porque também o sinto, que a nossa classe tem sido muito fustigada, ultimamente mais do que nunca, mas tem sido sempre colocada em causa, o que conduz, compreensivelmente,  a frustrações. Estas frustrações levam a que, ainda que tenhamos uma formação intelectual a nível superior, as projetemos naqueles que de forma imediata podem aliviar a tensão que estas provocam. É nesta medida que manifestamos comportamentos de alguma insensatez e em vez de assumirmos uma atitude de colaboração, necessária nesta forma de interação, assumimo-la em forma de retroação e desconfiança, levando a que, inconscientemente, se provoquem mais frustrações ainda.

Profforma – No momento atual, em Portugal, ser professor é uma profissão de risco?

Eu diria mais que é uma profissão arriscada, com tendência a ser riscada… Estamos num momento social e político em que não se aposta definitivamente na Educação. As preocupações não são pedagógicas e, assim sendo, não se avizinha como uma profissão a ser valorizada. De qualquer forma, tem algum risco. Um risco cuja origem poderá estar no conflito que muitas vezes existe entre a atribuição de uma classificação e a aquisição das aprendizagens.

Profforma – Como diretor de um Agrupamento que envolve professores dos diferentes ciclos, como encara o processo de formação contínua?

O processo de formação contínua dos professores de qualquer Agrupamento ou escola não agrupada é sempre um desafio, porque nunca se consegue propor as formações que os docentes acham que deveriam ter, nem tão pouco se consegue motivar os docentes para a formação que se considera pertinente terem. É curioso que, ainda em relação à questão anterior, muitos docentes sentem necessidade de formação na avaliação das aprendizagens. A situação em que nos encontramos relativamente à progressão na carreira, também não ajuda a ter uma perceção mais positiva em relação a esta formação.

Profforma – Qual a sua opinião sobre os CFAE e o trabalho que, há mais de 20 anos, tem sido desenvolvido por esta estrutura?

A minha opinião é a de que, sem estes centros, dificilmente os docentes conseguiriam ter a matéria que, apesar de muitas vezes ser contestada, lhes permitiu progredir até onde se progrediu. Vivemos numa região do país em que as oportunidades de formação não proliferam. Agora vão proliferando mais, na minha perspetiva fruto da redução dos alunos no ensino superior, mas efetivamente as condições para um desenvolvimento contínuo ainda não são as que se encontram em maiores centros metropolitanos. Por isso estes centros, nomeadamente o CEFOPNA que conheço melhor e do qual me orgulho de ser formador, tem tido, nos últimos anos, um dinamismo ao ponto de proporcionar formação em vários domínios da atividade docente. Portanto a avaliação não podia ser mais positiva.

Profforma – Em sua opinião, a formação contínua deve ser uma das condicionantes da progressão na carreira?

Eu acho que é importante que haja continuamente uma formação docente e que sem ela não deveria haver progressão na carreira. Nenhum profissional que não invista no desenvolvimento do capital humano poderá ter condições de responder aos desafios, cada vez mais prementes, da sociedade em que vivemos.

Profforma – Em sua opinião, quais os principais problemas que a Escola de hoje enfrenta?

Vou entender a Escola, neste contexto, como Instituição ou organização e não como estabelecimento de ensino. Desta forma, considero que há, sobretudo, três grandes problemas que a assolam. Um é relativo aos recursos humanos. A Escola não pode ter os recursos que quer, mas os que lhes são impostos e é com eles que tem de conseguir os intentos que lhe são cometidos, sendo que as idiossincrasias afetas a estes constituem uma grande barreira ao desenvolvimento de cada plano. Outro grande problema é a gestão do orçamento atribuído pelo estado. Sabemos que este é cada vez mais exíguo e é com grande constrição que se tem de conseguir implementar o que temos de implementar e dar resposta às despesas muitas delas inerentes à profissão docente. O outro são as mudanças constantes das políticas da educação que, de um momento para o outro nos deixa sem rumo e quando pensamos que o estamos a conseguir vem outra medida que nos impede de nos nortearmos.

Profforma – A gestão da rede escolar, no concelho de Portalegre, foi um processo que gerou algumas discordâncias. Sendo um direito dos pais a escolha da escola que querem para os seus filhos, como pensa que deve ser salvaguardado este direito na Escola Pública?

Eu aceito as “discordâncias” que referiu, mas não as compreendo. Veja. A nova gestão e organização da administração escolar criou os Agrupamentos de Escolas, segundo alguns critérios, para cumprir com alguns objetivos e conseguir outras finalidades. Os diplomas criados para o efeito, determinam que, para cumprir com as finalidades da sua constituição, os alunos possam ter uma formação sequencial, articulada e integral ao longo de toda a escolaridade, isto é, desde o pré-escolar até ao 12º ano, desde que tenham a oferta formativa pretendida pelos alunos. Por isso, uma vez integrando um Agrupamento de Escolas no pré-escolar esse aluno seria desse Agrupamento até acabar o ensino secundário. Neste momento, na cidade de Portalegre, existem dois Agrupamentos e uma Escola não agrupada. É natural que, de acordo com os diplomas legais, a escola não agrupada não tenha os alunos que sequencialmente passam de uns ciclos para outros. Por isso há que estabelecer forçosamente uma rede de forma a que estas escolas possam abrir e para que os Agrupamentos de Escolas possam cumprir com a sua missão. É discutível o número de turmas que foram determinadas pela DSRA-Dgeste para cada um dos Agrupamentos e Escola não agrupada, mas foi o que foi regulado e acho que não foi feito arbitrariamente. Por isso aceito a discordância, pois existe a tendência de se ter o maior número de alunos possível para garantir a colocação do maior número de professores possível. Não compreendo é a agitação que existe em torno desta condição, na medida em que – quer concordemos ou não, não é isso que está em questão – a verdade é que foi feita uma reforma na administração escolar e os que obedecem a essa reforma são os Agrupamentos de Escolas.

Profforma – Porque sonhar, e imaginar, faz parte da Escola, imagine que seria Ministro da Educação. Quais as três primeiras medidas que tomaria?

A primeira medida que tomaria era orientar as políticas educativas por questões de ordem pedagógica e não financeira. Outra, tendo como base a primeira, seria conferir uma verdadeira autonomia às escolas, para gerir tanto os recursos humanos como materiais, de forma a conseguir concretizar o projeto educativo. A terceira seria construir um programa de governação educativa, com a colaboração e compromisso de todos os partidos com assento parlamentar, que garantisse a estabilidade ao sistema de ensino, particularmente a estabilidade curricular, a estabilidade dos docentes e das políticas educativas.

Profforma – Como desenha a sua Escola de futuro?

Como escola de futuro que é, é utópica. Por isso seria uma escola concebida não ao nível da arquitetura, equipamento, tecnologia, ou conforto, antes ao nível da forma como as pessoas interagem e organizam o processo ensino-aprendizagem, a transmissão de conhecimentos e experiências entre professores, alunos, pais e cidadãos. Teria de ser uma escola fundada num pressuposto descentralizado, mediado por equipas multidisciplinares que representassem todos os atores da comunidade educativa e civil. A prioridade do Ministério da Educação seria a de proporcionar, à equipa diretiva, formação no âmbito da liderança em vez de formação administrativa, enfatizando o desenvolvimento de um pensamento estratégico inovador, com cuidado pela gestão de conflitos, competências estas necessárias para orientar e influir positivamente nos recursos humanos envolvidos na atividade de uma escola.