PROFFORMA

REVISTA ONLINE DO CENTRO DE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DO NORDESTE ALENTEJANO

 

 

 

 

Muito obrigada, Senhor Antão

Luísa Moreira
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O senhor Antão era alto, magro, amigo de toda a gente e de brincadeira fácil. Tinha uma secretária castanha escura, grande, com muitas gavetas de lado onde ele guardava, e às vezes deliberadamente esquecia, os registos de faltas dos alunos.

O senhor Antão estava normalmente de pé, cumprimentava respeitosamente os senhores professores, e sabia de cor o nome de cada um dos alunos. Sabia também, sempre com atualização, os namoros em curso ou em preparação… O senhor Antão conhecia as famílias dos alunos, ameaçava sem êxito, em total bonomia, que faria queixa, e era facilmente convencido a esquecer uma transgressão… Os alunos mais velhos, (quando se tem 12 – 13 anos um colega de 16 é um adulto), eliminavam faltas a troco de um copo de vinho, ou de uma cerveja, que ofereciam sempre com boa conversa. Creio que não havia, no tempo do velho Liceu Nacional de Portalegre, aluno que não conhecesse o senhor Antão. Eu, então aluna de 14 anos, todos os dias falava com ele e, muitas vezes, tantas que lhes perdi o conto, lhe pedi silêncio cúmplice para as minhas faltas. Um dia, dia de junho já, com muito calor, naquela fase em que, então sem educação sexual, as hormonas pulavam livremente, resolvi não ir à aula de lavores femininos para ficar a namorar.

Namorava-se, então, nas escadinhas do corro, hoje juvenil praça da república. Segura da proteção do senhor Antão, estava a gozar a minha tarde, a experimentar as ousadias da primeira paixão (ah! A primeira paixão…) quando, de surpresa, ele apareceu, colocando a cabeça por cima do corrimão, a dizer: - A tua mãe está na escola. E agora?!

É que a minha mãe era professora e, sendo uma quarta-feira de tarde, era suposto ela estar em casa… Apanhei um susto e perguntei o que fazer. Rápido, o senhor Antão disse-me: - Vai já para casa a correr e eu digo à tua mãe que te vi sair adoentada.  – Creio, sem estar a romancear, que ainda aproveitei mais um pouco de namoro e, depois, segui o conselho do senhor Antão.

No dia seguinte, ao chegar ao Liceu com a minha bata branca de gola aos quadradinhos azuis, o senhor Antão veio ter comigo e disse-me: - Então menina, lá em casa não te ensinaram a agradecer? !

Obrigada, Senhor Antão!

E muito obrigada a todos os funcionários, sejam operacionais ou contínuos, pelo carinho com que ajudam a educar gerações!