PROFFORMA

REVISTA ONLINE DO CENTRO DE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DO NORDESTE ALENTEJANO

 

 

 

 

 

Conversando com Carlos Percheiro, diretor do Agrupamento de Escolas N.º 3 de Évora

Luísa Moreira
CEFOPNA

O PNPSE (Plano Nacional de Promoção do Sucesso Escolar), que a PROFFORMA tem vindo a destacar nas últimas edições, veio exigir às escolas, e consequentemente de forma mais direta às direções, novas atitudes e novos processos. Assim, a PROFFORMA quis ouvir a opinião de quem, como diretor de uma escola, conhece e vive o processo de mudança.

 

PROFFORMA – O PNPSE foi lançado ainda no ano letivo de 2015/16. Considera que foi o tempo certo, tendo permitido numa reestruturação dos processos de aprendizagem nas escolas?

R- Embora se compreendam os constrangimentos associados aos requisitos da candidatura em que este Plano se insere, e não obstante a matéria que versa se constituir como preocupação permanente, manifestamente entendo que não foi o tempo próprio, exatamente por não ter permitido a desejável ponderação tendo em vista a necessária reestruturação dos processos de aprendizagem e, nesta conformidade, do tempo exigível para a preparação que se impunha. Julgo mesmo que a própria alteração de normativos tendentes ao melhor acolhimento do Plano permitiria tratá-lo de forma mais avisada. Diria ainda que, objetivamente, se experimenta a sensação que o lançamento do Plano terá sido precipitado.

PROFFORMA – Participou, com certeza, na formação realizada no âmbito da elaboração dos Planos de Ação Estratégica (PAE) de cada escola. Como avalia esse processo formativo?

R- Ter formação é sempre importante. No caso vertente não me parece que haja sido relevante. No entanto, a troca de experiências, o conhecimento de realidades diferenciadas, a elaboração de um elenco de preocupações, as soluções que se perfilam, não podem deixar de ser consideradas como factores que se devem sublinhar.

PROFFORMA – O PAE da escola que dirige foi, de facto, implementado? Como avalia todo o desenvolvimento do mesmo?

R- Foram implementadas 2 das 3 medidas selecionadas. A avaliação parece, no momento, prematura, embora a implementação de tais medidas esteja a corresponder, em geral, às expetativas criadas, que, em abono da verdade, não foram demasiado elevadas.

PROFFORMA – No âmbito do PNPSE houve um esforço de envolvimento de todas as lideranças intermédias. Considera que esse objetivo foi conseguido?

R- Esse é um objetivo que se vai conseguindo atingir. É “um fazendo” e não “um feito”. Releva-se, contudo, que a intervenção das lideranças diretamente ligadas à estruturação e desenvolvimento das medidas, se constituiu, inegavelmente, como o impulso necessário ao processo de concretização das mesmas. A disponibilidade dos líderes intermédios não foi despicienda.

PROFFORMA – Uma das críticas feitas ao PNPSE, sobretudo por alguns professores, é o facto de se afirmar que o sucesso é a vocação da escola. Como encara o problema do insucesso escolar em Portugal?

 R- Não sei se o sucesso é a vocação da Escola, mas o sucesso é seguramente o propósito da Escola, a sua própria razão de ser. Tenho revelado, nas sedes que considero adequadas, que como cidadão e como ator do sistema, sinto orgulho nos 40 anos de democracia que reergueram a educação em Portugal. Subscrevo, militantemente, a afirmação do Prof. Doutor Roberto Carneiro que o nosso país fez em 40 anos o que outros fizeram em mais de 200. Por isso, entendo que a Escola Pública é bem sucedida. Melhor seria, estou certo, se a Lei de Bases do Sistema Educativo não tivesse sofrido desvios não justificados e, pior, se não tivesse, em muitos aspetos, sido desvirtuada. Atribuir à Escola, de per si, a responsabilidade do sucesso é partilhar uma visão muito redutora de um fenómeno que tem, sobretudo, causas a ela exógenas. A construção, sempre um processo em desenvolvimento, da Educação só é votado ao sucesso se outras áreas e domínios da sociedade portuguesa forem, elas próprias tendencialmente bem sucedidas. Creio que a contribuição de um edifício legislativo que privilegie uma autonomia das escolas baseada na confiança da Administração, direito, afirmo, que as escolas adquiriram, uma formação inicial e contínua de professores que materialize a intervenção técnica que a eles cabe num quadro que lhes confira um estatuto suficientemente reconhecedor do papel insubstituível que ocupam, serão vetores que não podem ser menosprezados. O insucesso escolar, diga-se, não é a tónica da escola portuguesa. O que, commumente, se designa como combate ao insucesso, assume um carácter mais preocupante do que real, o que não significa que, de forma gradual, mas consolidada, se caminhe para maiores índices de sucesso. O desempenho dos estudantes portugueses em provas internacionais constitui, indiscutivelmente, a expressão do sucesso da nossa escola. O PNPSE é um contributo, entre outros, para a eficiência e para a eficácia do sistema, particularmente se acompanhado de medidas de natureza organizacional que sejam menos prescritivas e mais reguladoras.

 PROFFORMA – É comum, também, ouvirmos dizer que cada governo envolve as escolas em novas reformas, não permitindo o necessário tempo de desenvolvimento tranquilo de nenhum processo. Concorda com esta visão?

R- Em parte, dependendo das reformas em apreço. Como atrás afirmei, é que parece que o não cumprimento, em aspetos essenciais, da Lei de Bases teve uma consequência pouco recomendável que se traduziu não só no seu desrespeito, como permitiu a omissão pragmática de uma linha orientadora do sistema. Por este motivo, reformas têm existido que tendem a dar consecução à Lei de Bases, outras desvirtuam-na.

PROFFORMA – É certo que, sem o envolvimento de todos os parceiros, e sobretudo sem o querer (e o crer) dos professores, nenhuma mudança poderá ter sucesso. Considera que, no âmbito do PNPSE se conseguiu envolver, ativa e efetivamente, a maioria dos docentes?

R- Tenho as maiores dúvidas, mas neste como noutros processos o envolvimento é gradual e mais o será se caminhar para uma consolidação estrutural, com sucessivos momentos de avaliação institucional, com a introdução das correções que se venham a verificar convenientes. O Plano é, no momento, uma filosofia e uma aprendizagem, razão por que não deixa de ser um processo pouco maturado.

PROFFORMA – Para além das questões pedagógicas, também a questão financeira exige um olhar atento. Como vê o processo de submissão das candidaturas aos fundos comunitários em parceria com as autarquias?

R- Tenho dificuldade em pronunciar-me sobre as questões financeiras, embora me pareça que não é forçosamente negativo a parceria, ou em parceria, com as autarquias. As principais questões, a meu ver, são as dificuldades da gestão do Plano em parceria com as autarquias. No entanto, permito-me dizer que as Escolas deveriam ter sido dotadas de algumas verbas, como, aliás, se julga mais do que justificado. De novo se coloca o problema da autonomia e da confiança.

PROFFORMA – Em sua opinião, o facto de, obrigatoriamente, se terem de criar parcerias com os órgãos de poder local revelou-se um constrangimento, uma potencialidade ou um constrangimento que se transformou em fator de sucesso?

R- Não sendo factualmente e, por enquanto, um constrangimento, corre o risco de o ser, quando, em princípio, deveria constituir uma potencialidade. É nesta que ainda aposto para se transformar em factor de sucesso.

PROFFORMA – Termos como “pedagogias ativas, “dinâmicas colaborativas”, “aprendizagem por projeto” são, hoje, parte do léxico dos docentes. Em sua opinião, refletem mudanças de gramática de escola, ou apenas algum vanguardismo vocabular?

R- Não tenho, por enquanto, uma visão particularmente negativista de tais, e outras, expressões, se se afirmarem como tradutoras de novas abordagens pragmaticamente mais coadunantes com visões que se venham a revelar eficazes e que, naturalmente, se constituem e constituirão como uma nova gramática de escola. Não deixo de pensar que há, se não a maioria, quem as utilize sem saber bem o que significam. Os exemplos são abundantes.

PROFFORMA – O PNPSE, e sobretudo a concretização dos PAE’s de cada escola, vem exigir aos professores formação específica para responder aos desafios que se colocam. Considera que, na sua maioria, os docentes se sentem motivados, e recetivos, à frequência da formação, mesmo sabendo que continua o congelamento da progressão na carreira doente?

R- Tenho defendido a ideia, não difícil de testemunhar, que, hoje, um dos principais constrangimentos do sistema reside na desmotivação das profissões afetas ao ensino e à educação e, em particular, dos professores. Mas, como sempre, a disponibilidade dos docentes tem contrariado aquela ideia. Não sei até quando. A profissão docente é a tal da esperança sempre adiada. Tem-se explorado “até ao tutano” a ideia que os professores devem ter mais uma missão do que uma profissão. Falso. Ainda existe motivação, mas cada vez menos. Grave, muito grave.

 

PROFFORMA – A terminar, que balanço faz de todo o processo do PNPSE? Seria capaz de enunciar três potencialidades do mesmo, e três constrangimentos?

R- Embora não seja ainda o tempo de uma avaliação, julgo que o balanço não deixa de ser positivo, mas, repito, sem demasiadas expetativas de momento. A importância que o Plano assume é, voltando um pouco atrás, incompatível com a falta de persistência. Não deve, nem pode, ser abandonado, repetindo experiências sempre efémeras.

Potencialidades: a intrínseca ao Plano – o sucesso escolar

                               Legalizar o legitimo, contribuição que o Plano pode dar à autonomia de Escola

                               Permitir a contribuição alargada de vários atores, designadamente Escola/Autarquia/Pais e EE(s)

Constrangimentos: Articulação deficiente ou falta dela com as autarquias

                               Manutenção superestrutural do posicionamento prescritivo e não regulador, considerado em termos organizacionais.

                               Não garantir a prossecução do Plano, mesmo que os primeiros resultados não sejam animadores.

PROFFORMA – Senhor diretor, acredita que este é o Tempo da mudança que constrói sucesso?

R- Quero crer que sim, agora e sempre. Afinal a esperança é a última a morrer.

Muito obrigada!